Por Cynthia Duarte

No atual momento da ciência brasileira, o financiamento à divulgação científica tem se mostrado não apenas urgente, mas estratégico. Essa é a aposta do Instituto Serrapilheira, organização que vem se destacando por ajudar a aproximar a ciência da sociedade por meio do jornalismo e das mídias. Para Natasha Felizi, diretora do programa de Jornalismo e Mídia da instituição, o investimento na área tem um sentido cultural profundo: “A ciência, assim como as artes, deve ser parte importante da cultura de um país”.

Criado com a missão de promover a ciência no Brasil, o Serrapilheira acredita no fortalecimento de veículos nativos digitais e projetos que promovem a ciência de forma inovadora, questionadora e acessível. Segundo Felizi, o foco recai em iniciativas que não apenas traduzam o conhecimento científico, mas que o interroguem, contextualizem e promovam o pensamento crítico. “Escolhemos apoiar a divulgação científica por meio do jornalismo e da mídia por compreender que, no Brasil, existe um campo efervescente e inovador de veículos nativos digitais que se fortaleceu ao longo da última década e que não é contemplado pelas políticas de fomento à divulgação científica”.

De onde vem o apoio e como funciona o financiamento?

Os recursos distribuídos pelo Serrapilheira têm origem em um fundo patrimonial, alimentado por uma doação filantrópica. A partir dos rendimentos gerados por esse fundo, além de parcerias com outras organizações financiadoras, o instituto oferece editais e apoios diretos, priorizando projetos de jornalismo e mídia digital.

Além de produtos específicos — como podcasts, coleções de livros e conteúdos audiovisuais —, a instituição também incentiva formatos experimentais, que ajudem a combater a desinformação e a construir novas pontes entre o conhecimento científico e o público.

Embora a principal porta de entrada para o apoio financeiro seja por meio de chamadas públicas, o Serrapilheira também atua por busca ativa, o que garante certa fluidez no processo. Felizi explica: “Não há um canal oficial de solicitação, mas procuramos responder a todos que nos procuram para conversar”.

Desafios estruturais e oportunidades futuras

Quando se fala em financiamento científico, os obstáculos ainda são grandes. Felizi aponta que, do lado público, a descontinuidade das políticas de financiamento é um dos principais entraves. “A ciência precisa ser um projeto de Estado, não de governo”, destaca. Além disso, a burocracia e a rigidez dos modelos tradicionais dificultam o acesso a recursos, especialmente para iniciativas fora do ambiente acadêmico.

A fuga de cérebros também preocupa. “Mais de dez cientistas que apoiamos já decidiram deixar o país”, diz, explicando que esse dado mostra como precisamos criar melhores condições para reter talentos no Brasil. Nesse contexto, o Serrapilheira atua como agente de conexão, buscando oferecer recursos mais ágeis e flexíveis, alinhados às necessidades reais dos projetos de divulgação científica.

Apesar dos desafios, Felizi se mostra esperançosa quanto ao futuro. “Com governos aliados à ciência, podemos ter perspectivas de avanços de políticas públicas, de iniciativas em temas estratégicos como a conservação dos ecossistemas e da biodiversidade e empreender esforços para conectar melhor os investimentos”. Mas ela também alerta: “o risco de elegermos futuros governos que enxergam a produção de conhecimento como uma ameaça pode frear e atrasar muito esse avanço, que é lento”.

Confira as dicas valiosas da diretora do Serrapilheira para quem deseja submeter projetos:

1 – Sua proposta deve ser fácil de entender e agradável de ler. Responda exatamente o que foi perguntado pelo formulário, com atenção à linguagem.

2 – Seja original. Você precisa dizer o que o seu projeto tem de diferente dos outros (um formato inovador, uma abordagem inusitada, um público-alvo que ainda não está sendo atendido, etc.). Lembre-se que, para descobrir a originalidade do seu projeto, você primeiro precisa ter estudado o cenário geral e ter adquirido repertório. Assim você corre menos risco de criar algo parecido com o que já existe.

3 – Fuja dos clichês e das frases genéricas. Em vez de escrever que o seu projeto traz “um bate-papo sobre diferentes assuntos”, diga quais assuntos são esses. Em vez de falar que você vai fazer um produto “leve e descontraído” ou “sólido e rigoroso”, dê exemplos concretos que mostrem qual vai ser o tom do projeto.

4 – Seu resumo deve fisgar a atenção do avaliador. São aquelas duas frases capazes de deixar a pessoa com vontade de conhecer melhor o projeto. Não se preocupe, você vai ter outros campos do formulário para explicar melhor o formato, a estratégia, a equipe, a duração, as técnicas e os processos envolvidos.

5 – Evidencie o que torna vocês a equipe certa para fazer esse projeto. Vocês têm as habilidades necessárias? Uma bagagem cultural e profissional que tem tudo a ver com o projeto? As vivências que vão tornar tudo mais interessante? Diga tudo isso.

6 – Descreva bem o seu público-alvo. Seja específico, mostre que pesquisou e que conhece suas potenciais audiências. Diga quem são, onde vivem, o que fazem, do que gostam e como seu projeto vai satisfazê-los. Jamais escreva “público geral” quando for falar do seu público-alvo.

7 – Conte o que você já faz de bom e o quanto o seu projeto já cresceu, mas aproveite para contar também quais habilidades você e sua organização querem desenvolver ainda mais e por que esse apoio vai ser importante para o seu projeto.

8 – Escreva sua proposta e a deixe descansando por alguns dias. Quando você a ler de novo, vai notar pontos que ainda precisam ser trabalhados e vai perceber quais partes podem ficar de fora.